Convite aberto a sua excelência

25-03-2011 23:00

 

Autor: Geraldo Passos de Melo Barreto

CONVITE ABERTO A SUA EXCELÊNCIA

 

 

Depois de acompanhar as tragicômicas assembléias do Congresso Nacional; depois de assistir ao "Bem Amado" Odorico Paraguassu (não sei se com "Ç" ou com "SS" – dá no mesmo, ambos são analfabetos) encarapitar-se na marra na presidência do Senado; depois de entristecer-me com a cadavérica imobilidade dos legisladores e executores da lei frente ao nosso jurássico Código Penal; depois de ser obrigado a pagar do meu bolso viagens aéreas domésticas e internacionais para turismo de parlamentares, suas famílias e seus acólitos; depois de financiar à força planos de saúde privados vitalícios para os dignos "representantes do povo", enquanto os cidadãos que os sustentam morrem como moscas nas dantescas filas dos serviços públicos de "saúde"; depois de me ver "representado" por suplentes em quem nunca ninguém votou e ninguém sabe quem são; depois de me espantar por ver pessoas processadas por crimes de todos os tipos serem colocadas em cargos públicos de alta relevância; depois de saber de "atos secretos" que têm que continuar na moita, pelos motivos mais amedrontadores; depois de assistir aos Conselhos de Ética serem transformados em Comissões de Arquivamento de Broncas; depois de conseguir sobreviver aos "relevantes serviços prestados à Nação" prestados pelos nossos zelozos governantes; depois de ver minha cidadania ser histórica e seguidamente estuprada por essas malfadadas câmaras dos horrores, tomei uma drástica decisão: passarei orgulhosamente a usar meu oficial acessório de uso pessoal, a ser exibido em ocasiões importantes tais como velórios, shows de musica country, assaltos a bancos e sessões plenárias do Congrasso: meu nariz-de-palhaço, plantado como uma comenda vermelha bem no meio da minha cara, com direito a festa de comemoração e tudo o mais.

Em assim sendo, Excelência, venho convidá-lo à efeméride. V.Exa. encontrará velhos companheiros (não sei bem de quê, mas com certeza do mesmo saco de gatos), todos conhecidos beneméritos da patriamadasalvesalve, devidamente entupidos do dinheiro de nós todos e devidamente livres, com as bênçãos de V.Exa. e seus prepostos.

No evento estou pensando em encenar a peça "Georgina de Neve e os Sete Anões do Orçamento", ou talvez "A Terra dos Mensalões", ou quem sabe "Ali Babá e os Quarenta Banqueiros", ou mesmo "O Castelo do Deputado". Não sei se vai dar, pois os atores estão muito ocupados tentando desesperadamente, arrependidos que estão, livrar-se do dinheiro surrupiado e para isso estão gastando tudo em mansões, iates, jatinhos, carros de luxo e outros sacrifícios igualmente terríveis (acho que deveriam comprar empresas prestadoras de serviços ao Governo, pois seriam financiadas pelo BNDES, não pagariam e ainda poderiam roubar os impostos). De qualquer modo, prefiro não encenar nada relacionado à Câmara Distrital de Brasília, pois até os pais-de-santo estão evitando usar galhinhos de "arruda" nas orelhas. Dizem que atualmente está dando azar ...

Eu, na minha sacrossanta ignorância, penso que, se eu fosse um governante de qualquer coisa e alguém nomeado por mim pusesse na rua, por terem "bons antecedentes" um bando de ladrões julgados e condenados, me caberia no mínimo meter na mesma cela meu nomeado e os sacripantas que ele, do alto de seu podium ministerial, mandou soltar. Mas para felicidade do Povo (?!) V.Exa. liberalmente não pensa assim, o que me permite chamar quem eu quiser.

Por exemplo o Calmon, do Banco Econômico e os Irmãos Metralha, do Nacional, além dos donos dos bancos Marka, FonteCindam, Opportunity, etc. etc. etc., a exemplo de outras ilustres figuras do nosso corruptocrata cenário financeiro . Só não poderia contar com o pobre Juiz Lalau, arbitrária e selvagemente confinado àquele barraco horroroso onde mora, tendo que gastar tudo sem sair de casa (ainda bem que não vai aparecer aquele sanguinário lavrador que, com a reles e esfarrapada desculpa de que a família estava com fome, roubou sete galinhas do vizinho e deve ter pego uns vinte anos de cana: ele é um perigo para a sociedade!). Pensei até em convidar o tal de Pimenta Veiga, ex-diretor-de-qualquer-coisa de um dos maiores jornais do país. assassino confesso de uma jovem jornalista, preso, julgado e condenado, mas que há uma porrada de anos, sabe-se lá por que artes mágicas, continua livre leve e solto e se constitui um monumento à impunidade, marca registrada do risível e dinossáurico sistema judiciário desse pobre país. Se fosse um desempregado qualquer seguramente estaria cumprindo uma pena no inferno mesmo antes de morrer.

Mas a platéia será bastante eclética: usineiros de Pernambuco há décadas financiados pela SUDENE, que é craque em financiar financiamentos já financiados e jamais pagos. empresários que compram empresas que vendem o que não produzem para outros empresários que lhes venderam essas mesmas empresas, todos devidamente financiados pelos BNDES da vida; lá estarão também aqueles grandes empreiteiros que, com indescritíveis sacrifícios, construíram bem no meio da selva majestosas pontes e viadutos gigantes que ligam o nada a lugar nenhum pelo triplo do preço e-fica-tudo-por-isso-mesmo; não faltarão, é claro, candidatos às próximas eleições, esses pobres mártires que gastam fortunas para ganhar um salário miserável e ainda são obrigados a lotar seus gabinetes com uma enxurrada de parentes e apadrinhados sem concurso, sem qualificação e sem vergonha na cara. Acho que vai dar até para "passar a sacolinha" pela platéia, pedindo donativos para os pobres (afinal, eu também sou pobre) em sacos de 100kg (nesse caso peço "know-how" a qualquer dessas igrejas que estão na TV ) – só falam em Deus, mas faturam "o diabo" dos bolsos da grande massa ignara, com a mais absoluta omissão do "governo" , a quem o que menos interessa é uma população esclarecida.

Estou pensando em convidar até um guru indiano. Quem sabe o importado e iluminado sábio consiga explicar à minha insistente burrice por que diabos sou obrigado, até por lei, a chamar de "excelência" a um bando de assombrações que de ""excelente" não tem nada ?!?!?!

Só não farei dois convites: à Polícia Federal e ao Povão. À primeira porque sempre que prende alguém importante alguma "excelência" manda soltar; ao segundo, porque não sei como nem onde comprar quase 200 milhões de narizes-de-palhaço (talvez com os americanos, eles adoram nos vender esse tipo de coisa).

Ah, sim, Excelência, ia-me esquecendo do traje: é livre, mas o colarinho é obrigatório. Branco, por favor !

 

 

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